‘Ajudar as árvores a se moverem’: técnica aposta na migração de florestas contra o clima extremo
A migração assistida de árvores é uma estratégia de adaptação às mudanças climáticas, explicou o sociólogo
Arquivo pessoal/Felipe Jovani Tavares Moreira
Um pesquisador de Tatuí (SP) que estuda no Canadá há seis anos desenvolve um projeto sobre migração assistida de árvores, estratégia de adaptação às mudanças climáticas. A técnica consiste em plantar espécies florestais fora de sua área atual, em regiões onde o clima futuro tende a ser mais favorável à sobrevivência delas. A prática busca preservar a biodiversidade e reduzir perdas provocadas pelo aquecimento global.
“É ajudar as árvores a ‘se moverem’ para regiões mais frias ou mais úmidas, acompanhando o deslocamento das condições climáticas”, explica o sociólogo Felipe Jovani Tavares Moreira, doutorando em Ciências Geográficas. Segundo ele, esse processo natural levaria séculos.
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Quando começou?
O debate sobre migração assistida começou nos anos de 1980, quando pesquisadores apontaram que as árvores não conseguiriam acompanhar o ritmo das mudanças do clima. O tema ganhou força nos anos 2000 como tentativa de evitar a extinção de espécies ameaçadas.
O caso mais conhecido é o da Torreya taxifolia, árvore da Flórida em risco de desaparecer. Moradores passaram a plantá-la mais ao norte dos Estados Unidos para tentar garantir sua sobrevivência. A partir de 2010, governos e instituições passaram a considerar a estratégia, hoje presente em estudos e projetos piloto na América do Norte e na Europa.
“Sempre me interessei pela relação entre sociedade, clima e natureza. A migração assistida reúne elementos científicos, éticos e políticos, e essa interseção sempre me fascinou”, contou Moreira.
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O doutorado analisa como especialistas, profissionais do setor florestal e moradores do Quebec, no Canadá, percebem a migração assistida. O trabalho é estruturado em um estudo de caso com três frentes: entrevistas, pesquisa de opinião e revisão da literatura.
O foco está na percepção pública e na tomada de decisão, não na implementação direta de projetos em campo.
A migração assistida ainda é experimental, envolve monitoramento de décadas e pode falhar. O trabalho do pesquisador ainda está em desenvolvimento e não foi publicado em revista científica.
A migração assistida de árvores busca aumentar a adaptação das florestas diante do aquecimento global
Arquivo pessoal/Felipe Jovani Tavares Moreira
Como funciona esse processo?
A migração assistida envolve selecionar sementes de árvores que mostram maior tolerância ao clima futuro. Antes de qualquer teste em maior escala, são realizados estudos de viabilidade ecológica, modelagem climática, análises genéticas e experimentos controlados.
Moreira integra uma rede de pesquisadores do Canadá e dos Estados Unidos dedicada ao estudo da migração florestal. Essa rede reúne dados, projetos piloto e publicações sobre o tema.
“O monitoramento é contínuo e pode durar décadas, registrando crescimento, sobrevivência, riscos de pragas e adaptação”, disse o pesquisador.
Essas adaptações levam anos e têm risco de falha. Por isso, a técnica é aplicada de forma gradual, com avaliações constantes de riscos ecológicos, perda genética, expansão de pragas e impactos sociais.
Em países de clima temperado, as espécies são deslocadas para regiões mais ao norte ou para áreas mais altas, onde tende a ser mais frio. Em muitos projetos, esse deslocamento varia de 50 a 200 quilômetros, dependendo da espécie e das projeções climáticas.
Espécies com baixa diversidade genética, dependentes de solos específicos ou mais vulneráveis a pragas têm maior dificuldade de adaptação.
Os resultados da migração
Felipe az parte de uma rede de pesquisadores do Canadá e dos Estados Unidos, que estudam a migração florestal assistida
Arquivo pessoal/Felipe Jovani Tavares Moreira
Para Moreira, a tendência é que a migração assistida ganhe espaço conforme aumentam os impactos das mudanças climáticas. Secas extremas, pragas mais agressivas, incêndios severos e maior mortalidade já afetam florestas em várias regiões do mundo.
Setores econômicos dependentes da floresta e comunidades rurais também sentem os efeitos. Isso ampliou a busca por estratégias de adaptação.
“É motivador saber que meu trabalho pode contribuir para decisões reais que afetam o futuro das florestas. Mas é uma responsabilidade grande, porque lidamos com incertezas de longo prazo”, afirmou.
Situação no Brasil
A técnica ainda não é aplicada em larga escala no Brasil. Segundo Moreira, há potencial para uso em áreas específicas, como Cerrado, Caatinga e partes do Sul e Sudeste, onde secas mais intensas e declínio de espécies já são percebidos.
O país possui políticas rígidas de conservação, o que dificulta a introdução de populações de outras regiões. Além disso, o Brasil tem poucos “refúgios climáticos” frios e uma ecologia complexa. Por isso, a estratégia ainda é pouco utilizada no Sul Global.
O processo da migração florestal é uma estratégia que envolve incertezas, segundo o pesquisador de Tatuí
Arquivo pessoal/Patricia Raymond
Felipe, natural de Tatuí, acompanha os processos da migração assistida de árvores em Quebec, no Canadá
Arquivo pessoal/Patricia Raymond
*Colaborou sob supervisão de Carla Monteiro
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VÍDEOS: assista às reportagens da TV TEMFONTE: https://g1.globo.com/sp/itapetininga-regiao/noticia/2025/11/17/ajudar-as-arvores-a-se-moverem-tecnica-aposta-na-migracao-de-florestas-contra-o-clima-extremo.ghtml